O gracejo de um sábio em relação a um palácio
Um rei construiu um palácio que lhe custou cem mil dinares.
Adornado por fora de torres e cúpulas douradas,
era por dentro um paraíso, gracas aos móveis e tapetes.
Concluída a construção, o rei convidou homens
de todos os países para visitá-lo.
Os convidados chegaram carregados de presentes,
e o rei os fez sentarem-se ao seu lado.
Em seguida rogou-lhes:
"Dizei o que achais do meu palácio.
Esqueceu-se, acaso,
de alguma coisa cuja falta lhe desfigua a beleza?"
Todos protestaram que nunca existira na terra
um palácio igual e que nunca se veria outro semelhante.
Isto é, todos menos um,
um sábio,
que se levantou e disse...
"Existe senhor, uma pequena rachadura
que, para mim, constitui um defeito.
Não fora esse defeito
e o próprio paraíso vos traria presentes do mundo invisível."
"Não vejo defeito nenhum",
volveu o rei, colérico.
"És um ignorante e só queres fazer-te importante."
"Não, orgulhoso rei", revidou o sábio,
"A fresta a que me refiro é a mesma
pela qual passará Azrael, o anjo da morte.
Prouvera a Deus que pudésseis fechá-la,
pois, do contrário, para que prestam o teu palácio magnífico,
a tua coroa e teu trono?
Quando a morte chegar,
eles não passarão de um punhado de pó.
Nada subsiste,
e é isso que estraga a beleza da vossa morada.
Nenhuma arte poderá tornar estável o instável.
Ah! Não deposites vossas esperanças num palácio!
Não deixeis caracolar o corcel do vosso orgulho.
Se ninguém se atreve a falar com franqueza ao rei
e lembrar-lhe suas faltas,
isso é uma grande infelicidade."
(Farid Ud-Din Attar, em: A conferência dos pássaros)
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