sexta-feira, 25 de agosto de 2017

Como podemos chamá-lo (ao Uno) de "outro"? - Plotino

Por que não podemos permanecer lá no alto?
 É por não termos saído inteiramente deste mundo. 
Virá um tempo em que a contemplação será ininterrupta, 
posto que não haverá mais nenhum obstáculo do corpo. 

Aliás, não é a parte que contemplou que é velada pelo corpo, 
mas a racional: aquela que, 
quando a que contemplou está inativa no que diz respeito à contemplação, 
está ativa quanto ao conhecimento racional 
que consiste em demonstrações, provas e diálogos da Alma consigo mesma. 

Mas o ato de contemplar e o contemplador não são raciocinantes: 
são superiores, anteriores, transcendentes ao raciocínio (logismoi), 
como o próprio Objeto de sua contemplação.

Por isso, quando o contemplador contemplar a si mesmo (o Uno), 
verá a si mesmo como descrevemos, abrasado. 
Ou, antes, estará unido a si mesmo nesse estado, 
e terá consciência de estar nesse estado glorificado, 
uma vez que se tornou simples. 

Talvez não se deva dizer "verá a si mesmo", mas "será visto", 
se é possível dizer que o vidente e o objeto de sua visão são dois e não um.
 Portanto, nesse momento, o vidente não vê, 
nem distingue, 
nem imagina que são dois: 

mas tendo se tornado de certo modo outro, 
e não mais sendo ele mesmo, 
nem dele mesmo, 
pertence inteiro ao que está lá no alto, 
e, 
possuído por ele, 
é uno com ele, 
como se seu centro coincidisse com o Centro. 

Pois, mesmo aqui embaixo, dois centros que coincidem são um, 
mas tornam-se dois quando se separam. 

Por isso é difícil descrever essa visão. 
Pois, como podemos chamá-lo (ao Uno) de "outro", 
se no momento em que foi visto não foi visto como outro, 
mas uno com aquele que o viu?

Plotino - Enéada VI 9. 10