sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Sabedoria egípcia - Amenemope



De que vale estar ricamente vestido, se alguém se comporta como um fraudador diante de Deus? A faiança disfarçada em ouro se torna chumbo quando a luz nela bate. 

Não construas um barco pensando unicamente em dele tirar proveito. Pede o preço da passagem ao rico e faz passar gratuitamente o pobre.

Não dissocies teu coração de tua língua. Assim todas as tuas empresas chegarão a bom termo 

Mantém a firmeza de coração. Fortalece-o. Não conduzas o navio com tua língua. Embora a língua do homem possa tornar-se o leme do barco, é o senhor da totalidade que deve ser seu piloto. 

(Amenemope - 984 a.C.)  

Pensamentos soltos - Tat Wale Baba

"O EU é livre de qualquer tradição ou não tradição."

Yoga Guru Sri Tat Wale Baba

O espírito do outro - Taisen Deshimaru

O espírito do outro - Taisen Deshimaru

No Japão, um monge foi atirado sete vezes na prisão. Após cada libertação recomeçava a roubar e, logo, se deixava prender; desta maneira era-lhe possível ensinar os prisioneiros, todos os quais receberam as ordens monacais. O grande monge, que se chamava Shinhyo, continuou assim o seu jogo, até que os guardas, comovidos e perturbados, libertaram os prisioneiros e seu mestre. - O que ministra um ensinamento verdadeiro deve compreender o espírito do outro. 

(A Tigela e o Bastão - Contos Zen)

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Sobre as filosofias indianas, dualismo, não-dualismo qualificado e não-dualismo - Swami Vivekananda

Assim, o homem, depois de suas buscas vãs de vários deuses, completa o ciclo e descobre que  o Deus imaginado por ele como sentado no céu, governando o mundo, é seu próprio Eu. Nenhum outro, a não ser o Eu, era Deus, e o Pequeno "eu" jamais existiu. Desde os tempos mais recuados houve várias seitas espalhadas pela Índia, e, como nunca existiu uma igreja formulada ou reconhecida, ou corporação de homens para designar em cada escola doutrinas sobre o que se deveria acreditar, as pessoas tinham liberdade de escolher suas próprias fórmulas, fazer sua própria filosofia e estabelecer suas próprias seitas.
A primeira escola de que vos falarei é chamada escola dualística. Os dualistas acreditam que Deus, Criador e Governador do universo, está eternamente separado da natureza, eternamente separado da alma humana. Deus é eterno, a natureza é eterna, e eternas são todas as almas. A natureza e as almas manifestam-se e mudam, mas Deus permanece o mesmo. Segundo os dualistas, Deus é pessoal, pelo fato de ter qualidades, não por ter um corpo. Tem atributos humanos. É misericordioso, justo, poderoso, onipotente; podemo-nos nos aproximar d'Ele, orar para Ele, amá-Lo. Ele retribui o amor, e assim por diante. Numa palavra, é um Deus humano, apenas infinitamente maior do que o homem, sem qualquer dos defeitos que o homem tem. Não pode criar sem materiais, e a natureza é o material do qual Ele se serve para criar todo o universo.
A vasta massa do povo da Índia é dualista. Todas as religiões da Europa e da Ásia Ocidental são dualistas: têm de ser dualistas. O homem comum não pode pensar em coisa alguma que não seja concreta. Gosta, naturalmente, de agarrar-se ao que o seu intelecto apreende. Essa é a religião das massas, em todo o mundo. Acreditam num Deus inteiramente separado delas, um grande rei, um poderoso monarca, por assim dizer. Ao mesmo tempo, fazem-no mais puro do que os monarcas de Terra; dão-lhe todas as boas qualidades e removem dele todos os defeitos, como se fosse possível o bem existir sem o mal, ou qualquer concepção de luz sem a concepção das trevas!
Eis a primeira dificuldade no que se refere às teorias dualísticas: como é possível que sob a direção de um Deus justo e misericordioso haja tantos males no mundo? Essa pergunta se ergue em todas as religiões dualísticas, mas os hindus jamais inventaram Satã para dar uma resposta a tal indagação. Os hindus concordam em lançar a culpa sobre o homem, e é fácil para eles fazer isso. Por quê? Porque não acreditam que as almas tivessem sido criadas do nada. Vemos, nesta vida, que podemos modelar e formar nosso futuro. Cada um de nós, todos os dias, está tentando modelar o amanhã. Hoje, fixamos o destino do amanhã; amanhã fixaremos o destino do dia seguinte, e assim por diante. É bastante lógico que esse raciocínio seja empregado também para o tempo pregresso. Se pelas nossas ações modelamos nosso destino no futuro, por que não aplicar a mesma regra ao passado? Se, numa corrente infinita, um certo número de elos são alternadamente repetidos, e se um desses grupos de elos pode ser explicado, poderemos explicar toda a cadeia. Assim, nessa infinita extensão de tempo, se podemos secionar uma porção dele, e explicá-lo, e compreender essa porção, podemos, se é verdade ser a natureza uniforme, dar a mesma explicação à toda a corrente de tempo. Se é verdade que estamos trabalhando nosso própria destino, aqui, neste pequeno espaço de tempo, se é verdade que tudo deve ter uma causa, como vemos agora - deve ser verdade, também, que o que somos agora é o efeito de todo o nosso passado.
Portanto, não se faz necessário ninguém para modelar o destino da humanidade, a não ser o homem. Os males existentes no mundo são causados somente por nós mesmos. Nós causamos todos esses males, e assim como estamos constantemente vendo o sofrimento como resultante de más ações, podemos ver que nunca da angústia existente no mundo é efeito da maldade passada do homem. Só o homem, portanto, de acordo com esta teoria, é responsável. Deus não deve ser culpado. Ele, o Pai eternamente misericordioso, não deve absolutamente ser culpado. "Colhemos o que semeamos. Outra doutrina dos dualistas diz que todas as almas devem, finalmente, alcançar a salvação. Nenhuma delas ficará do lado de fora. Através de várias vicissitudes, através de vários sofrimentos e prazeres, cada uma delas sairá, por fim. Sairá de quê? A idéia comum é a de que todas as almas têm de sair deste universo. Nem o universo que vemos e sentimos, nem mesmo um universo imaginário, podem ser o certo, o verdadeiro, porque ambos estão mesclados com o bem e o mal. Segundo os dualistas, há, para além deste universo, um lugar cheio de felicidade e de bem, apenas, e quando esse lugar for alcançado, não haverá mais necessidade de nascer e renascer, de viver e morrer, e essa idéia lhes é muito cara. Ali não há mais doenças, não há morte. Existirá uma felicidade eterna, e eles estarão na presença de Deus todo o tempo, e gozarão essa presença para sempre. Acreditam que todos os seres, do verme mais baixo até os mais altos anjos e deuses, atingirão, mais cedo ou mais tarde, o mundo onde não mais haverá sofrimento. Mas nosso mundo jamais terminará. Continuará a existir infinitamente, embora movendo-se em ondas. Embora movendo-se em ciclos, jamais terminará. O número de almas que devem ser salvas, que devem ser aperfeiçoadas, é infinito.
A verdadeira filosofia Vedanta começa com os que são conhecidos como não-dualistas qualificados. Declaram eles que o efeito jamais difere da causa; que o efeito é a causa reproduzida sob outra forma. Se o universo é o efeito e Deus é a causa, o universo deve ser o próprio Deus; não pode ser senão isso. Começam eles com a afirmativa de que Deus é, ao mesmo tempo, a causa eficiente do universo e seu Criador, e, ainda, o material do qual se projetou toda a natureza. A palavra "criação" de vossa língua, não tem equivalente em sânscrito, porque não há seita, na Índia, que acredite na criação, tal como ela é vista no Ocidente, isto é, algo que veio do nada. O que entendemos por criação é a projeção do que já existia. Bem: o universo inteiro, de acordo com esta seita, é o próprio Deus. Ele é o material do universo. Lemos nos Vedas:


"Assim como a aranha tece a linha tirada de seu próprio corpo, todo o universo, da mesma maneira, vem daquele Ser".


Se o efeito é a causa reproduzida, a questão é a seguinte: como podemos achar que este universo ininteligente, bronco, material, foi produzido por um Deus que não é material, mas é inteligência eterna? Como, se a causa é pura e perfeita, o efeito pode ser tão diferente? Que dizem esses não-dualistas qualificados? A teoria deles é muito peculiar. Dizem que os três - Deus, natureza e a alma - são um. Deus é, por assim dizer, a alma, e a natureza, e as almas são o corpo de Deus. Tal como eu tenho um corpo e uma alma, todo o universo e todas as almas são o corpo de Deus, e Deus é a Alma das almas. Assim, Deus é a causa material do universo. O corpo pode ser modificado - pode ser jovem ou velho, forte ou fraco - mas isso em nada afeta a alma. É a mesma existência eterna, manifestando-se através do corpo. Corpos vêm e vão, mas a alma não muda. Mesmo assim o universo inteiro é o corpo de Deus, e nesse sentido é Deus. Mas a mudança do universo não afeta Deus. Desse material Ele cria o universo, e, ao fim de um ciclo, Seu corpo se torna mais fino, contrai-se, e no início de outro ciclo torna-se novamente expandido, e dele emanam todos esses mundos diferentes.
Ora, tanto os dualistas como os não-dualistas qualificados, admitem que a alma é, por sua natureza, pura, mas, através de suas próprias ações, torna-se impura. Os não-dualistas qualificados expressam isso de uma forma mais bela do que os dualistas, dizendo que a pureza e a perfeição da alma se contraem e de novo se manifestam, e que o que estamos tentando fazer agora é a remanifestação da inteligência, da pureza e do poder que são naturais à alma. Cada má ação contrai a natureza da alma, e toda a boa ação a expande. E essas almas são, todas, parte de Deus. "Assim como do fogo violento voam milhares de faíscas da mesma. natureza, desse Ser infinito, de Deus, essas almas vieram." Todas têm o mesmo objetivo. O Deus dos não-dualistas; qualificados é também um Deus pessoal, só que interpenetra tudo no universo. É imanente em tudo e está em toda a parte, e quando as Escrituras dizem que Deus é tudo querem dizer que Deus interpenetra tudo, não que Deus se tornou uma parede ou que Deus está na parede. Não há uma partícula, não há um átomo do universo onde Ele não esteja. As almas são limitadas, não têm onipresença. Quando conseguem a expansão de seus poderes e tornam-se perfeitas, não há mais nascimento nem morte para elas, mas vivem em Deus para sempre.
Chegamos agora ao Advaitismo, a última e - assim a consideramos - mais bela flor da filosofia e da religião que qualquer país e em qualquer tempo já produziu, quando o pensamento humano atinge sua expressão mais alta, e vai mesmo além do mistério que parece ser impenetrável. É a Vedanta não-dualística. É demasiado complexa, demasiado elevada, para ser religião das massas. Mesmo na Índia, seu berço natal, onde tem governado, suprema, pelos três últimos milênios, não conseguiu permear as massas.
Conforme continuamos, verificaremos o quanto é difícil mesmo para o homem ou a mulher mais considerados de qualquer país o compreender o advaítísmo - pois nos fizemos tão fracos, pois nos fizemos tão baixos. Quantas vezes me pediram uma "religião que conforte"! Poucos são os homens que pedem a verdade, menor número ainda ousa estudar a verdade, e ainda mais insignificante é o total dos que ousam segui-La em todas as suas significações práticas. Não é culpa deles. Não passa de fraqueza do cérebro. Qualquer pensamento novo, especialmente de alta qualidade, cria uma perturbação, tenta fazer um novo canal, por assim dizer, na matéria cerebral, e isso desengonça o sistema, retira aos homens o seu equilíbrio. Estão habituados a certo ambiente e precisam dominar a massa imensa de velhas superstições, superstições ancestrais, superstições de classe, superstições da cidade, superstições do país, e, além de tudo, a vasta massa de superstições inata a todo o ser humano. Ainda assim há algumas almas corajosas neste mundo, que ousam conceber a verdade, que ousam recebê-la, e que ousam segui-Ia até o fim.
Que declaram os advaitistas? O seguinte: Se há um Deus, esse Deus deve ser ao mesmo tempo a causa material e eficiente do universo. Não só é o Criador, mas é também o criado. Ele próprio é este universo. Como pode ser isso? Deus, o puro, o espírito, tornou-se universo? Sim, aparentemente é assim. Aquilo que todas as pessoas ignorantes vêem como universo, não existe, realmente. Que somos, vós e eu, e todas as coisas que vemos? Simples auto-hipnotismo. Não há senão uma Existência, a Infinita, a sempre abençoada. Nessa Existência sonhamos todos esses vários sonhos. É o Atman para além de tudo, o Infinito, para além do conhecido, para além do conhecível, e através disso vemos o universo. Essa é a única realidade. Ela é esta mesa, é a parede, é tudo, menos o nome e a forma. Retirai a forma da mesa, retirai-lhe o nome, e o que permanecer será a mesa. O vedantista não diz "ele" ou "ela", pois essas são ilusões, ficções do cérebro humano. Não há sexo na alma. As pessoas que estão sob a ilusão, que se tornaram como que animais, vêem a mulher ou o homem. Deuses vivos não vêem homens nem mulheres. Como podem vê-los, eles que estão para além de tudo que tenha idéia de sexo? Tudo e todos são Atman, o Eu - assexuado, puro, sempre abençoado. O nome, a forma, o corpo, é que são materiais, e fazem toda essa diferença. Se retirardes essas duas diferenças de nome e forma, todo o universo é um. Não há dois, mas um por toda a parte. Vós e eu somos um. Não há natureza, nem Deus, nem universo - apenas uma Existência infinita, da qual, através de nome e de forma, todas essas coisas são manufaturadas. Como conhecer o Conhecedor? Ele não pode ser conhecido. Como podeis ver vosso próprio Eu? Só podeis refletir vós mesmos. Assim, todo este universo é o reflexo desse ser eterno, o Atman, e como o reflexo tomba sobre bons ou maus refletores, também imagens boas ou más são adicionadas. Assim, no assassino o refletor é mau, e não o Eu. No santo o refletor é puro. O Eu, o Atman, é, por sua própria natureza, puro. É a mesma, a única Existência do universo, que se reflete desde o mais baixo verme até o mais alto e mais perfeito dos seres. O todo deste universo é uma unidade, uma Existência, fisicamente, mentalmente, moralmente, e espiritualmente. Estamos considerando essa Existência única em diferentes formas e criando todas essas imagens sobre Ela. Para o ser que se limitou às condições de homem, Ela aparece como o mundo do homem. Para o ser que está em plano mais alto de existência, Ela pode parecer como o céu. Há apenas uma alma no universo, não duas. Não vem, nem vai. Não nasce, não morre, não se reencarna.
Como pode morrer? Para onde pode ir? Todos esses céus, todas essas terras, são vãs imaginações da mente. Não existem, jamais existiram no passado, e jamais existirão no futuro. Eu sou onipresente, eterno. Para onde posso ir? Onde ainda não estou desde já? Estou lendo este livro da natureza. Página por página estou terminando-o, e voltando-as, e um por um os sonhos da vida se vão. Outra página da vida foi voltada, outro sonho da vida chega, e vai, rolando, rolando. E quando eu tiver terminado minha leitura, abandono-a e ponho-me de lado. Atiro fora o livro, e tudo estará terminado.
Que pregam os advaitistas? Destronam todos os deuses que já existiram ou existirão no universo, e colocam naquele trono o Eu do homem, o Atman, maior do que o Sol e a Lua, mais alto do que os céus, maior do que este próprio grande universo. Nenhum livro, nem escrituras, nem ciência, podem jamais imaginar a glória do Eu que aparece como homem - o Deus mais glorioso que já existiu, o único Deus que já existiu, existe, ou jamais existirá.
Devo adorar, portanto, apenas o meu Eu. "Eu cultuo o meu Eu" - diz o advaitista. "Diante de quem devo-me curvar? Eu saúdo o meu Eu. A quem devo pedir auxílio? Quem pode me ajudar, a mim, o Ser Infinito do universo?" Esses são sonhos aloucados, alucinações. Quem jamais ajudou alguém? Ninguém Onde virdes um homem fraco, um dualista, chorando e gemendo por auxílio vindo de algures, de cima dos céus, é porque ele não sabe que os céus também estão nele. Deseja auxílio dos céus, e o auxílio vem. Vemos que vem, mas vem de dentro dele própria, e ele se engana supondo que vem de fora. Às vezes, um doente jaz no leito e pode ouvir que batem à porta. Levanta-se, abre, e vê que ali não há ninguém. Volta ao leito e de novo ouve que batem. Levanta-se e abre a porta. Ninguém ali está. Por fim descobre que eram as panca as de seu próprio coração que lhe pareciam pancadas na porta.
Assim o homem, depois de procurar em vão os vários deuses fora de si próprio, completa o ciclo e volta ao ponto do qual iniciou sua busca - a alma humana. E descobre que aquele Deus procurado sobre montes e vales, que buscava encontrar em cada livro, em cada templo, nas igrejas e nos céus, aquele Deus que ele imaginava sentado no paraíso, a governar o mundo, era seu próprio Eu. Eu sou Ele, e Ele é Eu. Só Eu era Deus e o pequeno "eu" jamais existiu.
Entretanto, como pode iludir-se esse perfeito Deus? Nunca o foi. Como poderia um deus perfeito estar sonhando? Nunca sonhou. A verdade jamais sonha. A própria indagação de onde surgiu essa ilusão é absurda. A ilusão surge apenas da ilusão. Não haverá ilusão desde que a verdade seja vista. A ilusão sempre repousa na ilusão, jamais repousa em Deus, na Verdade, no Atman. jamais estais em ilusão, é a ilusão que está em vós, diante de vós. Uma nuvem aqui está. Outra vem, expulsa a primeira e toma o seu lugar. Vem uma terceira, que por sua vez expulsa essa. Assim como diante do céu eternamente azul nuvens de várias tonalidades e colorações surgem, permanecem por um. pequeno espaço de tempo, e desaparecem, deixando o mesmo e eterno azul, vós sois, eternamente, puros, perfeitos. Sois os verdadeiros Deuses do universo. Não, não há dois, só há' um. É um engano dizer "vós" e "eu". Sou eu quem está comendo através de milhões de bocas. Portanto, como posso ter fome? Sou eu quem trabalha através de um número infinito de mãos. Como posso estar inativo? Sou eu quem vive a vida de todo o universo. Onde está a morte para mim? Eu estou acolá da vida, acolá de toda a morte. Onde procurarei a liberdade, se sou livre por minha natureza? Quem pode constranger-me, a mim, o Deus do universo? As escrituras do mundo não passam de pequenos mapas, desejando delinear a minha glória, pois sou a única existência do universo. Então, que representam esses livros para mim? Assim fala o advaitista


"Conhece a verdade e liberta-te num momento.` Toda a treva desaparecerá, então.


Quando o homem se tiver visto como Um- com o Ser Infinito do universo, quando toda a separação cessar, quando todos os homens e mulheres, todos os deuses e anjos, todos os animais e plantas, e todo o universo, se tiverem desvanecido nessa Unidade, então o medo desaparecerá. Posso magoar-me? Posso matar-me? Posso injuriar-me? A quem posso temer? Podeis temer a vós mesmos? Então, todo o desgosto desaparecerá. Quem me pode causar desgosto? Eu sou a Existência única do universo. Então, todos os ciúmes desaparecerão. De quem terei ciúmes? De mim próprio? Então, todos os maus sentimentos desaparecerão. Contra quem terei maus sentimentos? Contra mim mesmo? Não há ninguém no universo a não ser eu. Esse é o único caminho, dizem os vedantistas, para o conhecimento. Matai as diferenciações, matai essa superstição de que existem muitos. "O que está neste mundo de muitos, vê aquele Único. O que está nesta massa de inconsciência, vê aquele único Ser consciente. Quem está neste mundo de sombras, aprende aquela Realidade - e nela está a paz eterna e em ninguém mais, "em ninguém mais."
São esses os pontos principais dos três passos que o pensamento religioso hindu tomou em relação a Deus. Vimos que ele começou com um Deus pessoal, extracósmico. Foi do Deus externo para o Deus imaneme no universo. E terminou identificando a própria alma com aquele Deus, e fazendo uma Alma, uma unidade, de todas essas várias manifestações do universo. Esta é a última palavra dos Vedas. O pensamento religioso hindu começa com o dualismo, passa através do não-dualismo qualificado, e termina em perfeito não-dualismo.
Sabemos que poucos neste mundo podem chegar a este último ponto, ou mesmo podem ter a ousadia de acreditar nele. Menor é o número dos que ousam agir de acordo com ele. Entretanto, sabemos que nele está a explicação para toda a ética, para toda a moralidade, para toda a espiritualidade do universo. Por que dizem todos: "Fazei bem aos outros?" Onde está a explicação ? Por que todos os grandes homens pregaram a fraternidade da humanidade, e outros maiores pregaram a fraternidade de todas as vidas? Porque, fossem ou não fossem conscientes disso, para além de tudo, através de todas as suas irracionais superstições pessoais, estavam fitando diante de si a eterna luz do Eu, negando todas as multiplicidades, e afirmando que todo o universo não passa de Um.
Assim, a última palavra nos deu um universo, que vemos, através dos sentidos, como matéria, através do intelecto como alma, e através do espírito como Deus. Para o homem que se envolve em véus, os véus que o mundo chama perversidade e mal, esse mesmo universo mudará e se transformará num lugar hediondo. Para outro homem, que deseja prazeres, esse mesmo universo se modificará e se tornará um céu. E para o homem perfeito tudo desaparecerá, e se tornará seu próprio Eu. Bem: tal como a sociedade existe no tempo presente, todos esses três estágios são necessários. Uma absolutamente não nega o outro, antes é, simplesmente, a complementação do outro. O advaitista, ou o advaitista qualificado, não diz que esse dualismo é errado: é uma visão certa, mas inferior. Está a caminho da verdade. Portanto, que cada qual tenha sua própria visão deste universo, de acordo com suas próprias idéias. Não injurieis ninguém, não negueis a posição de ninguém. Tomai o homem como ele é, e, se puderdes, dai-lhe mão de auxílio e colocai-o em plataforma mais alta. Mas não o injurieis nem destruiais. Todos chegarão à verdade, com o correr do tempo. "Quando todos os desejos do coração forem dominados, esse mesmo mortal se tornará imortal." Então, o mesmo homem se tornará Deus.

Swami Vivekananda - Quatro Iogas de Auto Realização

Pensamentos soltos - Swami Vivekananda

Essa é a única forma de alcançar a meta, dizer a nós próprios e dizer a todos os demais, que somos divinos. E, conforme repetirmos isso, a força virá.

Swami Vivekananda

sábado, 18 de dezembro de 2010

Poemas - Jalaludin Rumi - A morte e o amor

A morte e o amor

Só a morte põe fim seguro
às dores e aflições da vida.
A vida, porém,temerosa,
tudo faz para adiar esse encontro.


É que a vida vê da morte
apenas a mão sombria
e fecha os olhos à luzente taça
que a mesma morte oferece.


Asim também foge do amor
o coração apaixonado,
receoso de um dia morrer
da mesma paixão por que vive.

"Lá onde nasce o verdadeiro amor 
morre o 'eu', esse tenebroso déspota. 
Tu o deixas expirar no negro da noite 
e livre respiras à luz da manhã." 

- Djalal Ud-Din-Rumi -

Upanishads - Mundaka Upanishad (Excerto)

Brilhante Ela é, a luz das luzes - 
Aquilo que os conhecedores da alma conhecem! 
O sol não brilha lá, 
nem a lua ou as estrelas; 
estas iluminações não brilham, 
muito menos este fogo, terrestre. 
Conforme Ele, 
como Ele brilha, 
é que tudo brilha. 
Este mundo todo está iluminado com Sua Luz, 
na frente... atrás... à direita, e à esquerda,
esticado abaixo e acima. 

Mundaka-Upanishad

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Pensamentos soltos - Kalidasa


Olhe para este dia:
Pois é a vida, a própria vida da vida.
No seu breve curso
Deite-se todas as verdades e realidades de sua existência.
A bem-aventurança do crescimento,
A glória da ação,
O esplendor da realização
Mas são experiências de tempo.

Para ontem é apenas um sonho
E amanhã é apenas uma visão;
E hoje bem vivido, faz
Ontem, um sonho de felicidade
E todo amanhã uma visão de esperança.
Vejam bem, portanto, a este dia;
Essa é a saudação ao amanhecer sempre novo!!

(Kālidāsa)*

* Kalidaça ou Kalidasa ou Calidaça foi um poeta e dramaturgo hindú. O mais notável dos dramaturgos sânscritos e o maior nome da literatura sânscrita depois de Asvaghosas (século III a.C. - c. 375 a.c.). A sua vida está oculta por um véu de lendas. Deve ter sido um estrangeiro convertido à via brâmane. Era a mais brilhante das nove gemas na corte de Vikramaditya de Ujjain. Eminente nas artes e ciências do seu tempo, desde a astronomia à política. A tradução do seu Sakuntala no princípio do século XIX foi entusiasticamente aclamada por Goethe e revelou a toda a Europa as realizações de nível insuspeito que a literatura sânscrita atingira.

domingo, 12 de dezembro de 2010

Pensamentos soltos - Blake

He who blinds to himself a Joy, 
doth the winged life destroy; 
But he who kisses the Joy as it flies, 
lives in Eternity´s sunrise.

William Blake



Tradução livre:

Aquele que se cega perante uma alegria
destrói a alada vida fugidia
Mas, aquele que a beija
enquanto em vôo está
Na aurora da Eternidade viverá.

sábado, 11 de dezembro de 2010

The angel that presided o´er my birth - William Blake



The angel that presided o´er my birth
Said "Little creature, formed of joy and mirth,
Gone love, without the help of anything on earth

William Blake


(The selected poems of William Blake, F.W. Bateson, Gravura: Ilustração de Blake no livro Paraíso Perdido de Milton.) 


Trad livre

O anjo que presidira meu nascimento
Disse: "Criaturinha, feita de alegria e contentamento,
Vá amar na Terra, sem nenhum esclarecimento!

sábado, 4 de dezembro de 2010

Código de Ética dos Índios Americanos



"A natureza não é PARA nós, ela é uma PARTE de nós"


Levante com o sol. Reze sozinho. O Grande Espírito só escutará, se você falar.

Seja tolerante com os que estão perdidos em seus caminhos. Ignorância, preconceito e aborrecimento, formam uma alma perdida. Reze para que achem um guia.

Se procura, procure por si próprio. Não permita que outros percorram o caminho por você. É sua estrada, e somente sua. Outros poderão caminhar com você, mas ninguém poderá caminhar por você.

Trate visitas em sua casa com muita consideração. Sirva-lhes a melhor comida, dê-lhes a melhor cama e trate-os com respeito e honra.

Não tire o que não é seu de uma pessoa, da comunidade, da natureza ou de uma cultura. Não foi merecido nem dado. Não é seu.

Respeite todas coisas sobre a terra - sendo pessoas, animais ou plantas.

Respeite os pensamentos, desejos e palavras dos outros. Nunca interrompa nem zombe ou faça mímicas rudes deles. Permita que todos se expressem livremente.

Nunca fale mal dos outros. A energia negativa que você põe no universo se multiplicará quando voltar para você.

Todas as pessoas cometem erros. E todos os erros podem ser perdoados. Maus pensamentos causam doença da mente, corpo e espírito. Pratique otimismo.

Natureza não é PARA nós, é uma PARTE de nós. Ela é parte da sua família mundial.

Crianças são as sementes do futuro. Plante amor no coração delas e regue com sabedoria e lições de vida. Quando estiverem crescendo, dê-lhes espaço para crescer.

Evite machucar corações alheios. O veneno de sua dor retornará para você.

Sempre seja verdadeiro. Honestidade é o teste da própria vontade neste universo.

Mantenha seu equilíbrio. Sua auto-vontade, auto-espiritualidade, auto-emoção e auto-estima necessitam estar fortes, puras e saudáveis. Trabalhe o corpo para fortalecer a mente. Cresça rico de espírito para curar males emocionais.

Faça decisões conscientes de quem você quer ser e como reagirá. Seja responsável por seus atos.

Respeite a privacidade e espaço pessoal dos outros. Não toque na propriedade particular dos outros - especialmente objetos pessoais e religiosos. Isso é proibido.

Seja verdadeiro consigo mesmo. Você não poderá ajudar aos outros se não se ajudar primeiro.

Respeite as crenças religiosas dos outros. Não force sua crença religiosa aos demais.

Compartilhe seu bem estar com os outros. Participe com seu amor ao próximo.

Comunidade no Orkut - Filosofia Oriental

 

Caros leitores e leitoras,

Criei essa comunidade no Orkut para disponibilizar algumas obras sobre as filosofias orientais. 
Iniciaremos em 2011 um grupo de leitura e pesquisa sobre Filosofia Oriental no Departamento de Filosofia da UEM.
A participação de todos com postagens é muito bem vinda.
Namaste




quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Pensamentos soltos - Mestre Eckhart

Quando está um homem em simples compreensão?
Respondo: Quando um homem vê uma coisa separada da outra.
E quando está um homem acima da mera compreensão?
Isso posso dizer-vos:

Quando um homem vê Tudo em tudo,
está além da simples compreensão

Mestre Eckhart

Pensamentos soltos - Sutra Prunabuddha

Concluída a iluminação, o bodisatva está livre da servidão das coisas, mas não procura libertar-se das coisas. O samsara (o vir-a-ser) não é odiado por ele, nem o nirvana é amado. Quando resplandece, a perfeita Iluminação não é servidão nem libertação.

Sutra Prunabuddha

Pensamentos Soltos - Aldous Huxley

Em outras palavras, há uma hierarquia do real. O mundo múltiplo da nossa experiência cotidiana é real, de uma realidade relativa, indiscutível em seu próprio nível; mas essa realidade relativa tem seu ser no interior e por causa da Realidade absoluta, a qual, em razão da diversidade incomensurável de sua natureza eterna, nunca poderemos esperar descrever, ainda que nos seja possível apreendê-la diretamente. 

A. Huxley - A filosofia Perene, 1990, p.47

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Pensamentos soltos - Yoganandaji

"Todas as religiões verdadeiras levam a Deus", disse Paramahansaji. "Procura até encontrares o ensinamento espiritual que atraia e satisfaça plenamente teu coração. E, ao encontra-lo, não permitas que nada afete a tua lealdade. Dedica a esse caminho toda a tua atenção. Focaliza tua consciência totalmente nele e alcaçarás os resultados que procuras"

Do livro: Relacionamento Guru-Discipulo

Pensamentos soltos - Ramakrishna

Aquele que conhece o Deus que está dentro dele, sabe que o mesmo reside no coração de todos os seres vivos

(Bhagvan Sri Ramakrishna)

Livros - O Reino de Deus - Antonio Hilário Alves

sábado, 27 de novembro de 2010

Pensamentos soltos - Jalaludin Rumi

O meu lugar é sempre o não lugar,
não sou do corpo, da alma, sou do Amado
O mundo é apenas Um, venci o Dois.
Sigo a cantar e a buscar sempre o Um

Jalaludin Rumi

sábado, 20 de novembro de 2010

Pensamentos soltos - Carlos Castaneda


Se o seu espírito está distorcido, ele deve simplesmente endireitá-lo — purificá-lo, torná-lo perfeito —, pois não há nenhum outro trabalho, em todas as nossas vidas, que valha mais a pena. Não endireitar o espírito é procurar a morte, e isso é o mesmo que não procurar nada, pois a morte nos apanhará, de qualquer maneira. Buscar a perfeição do espírito do guerreiro é a única tarefa digna de nosso tempo limitado e de nossa virilidade. 

Quando um guerreiro resolve fazer alguma coisa, ele deve ir até o fim, mas tem de assumir a responsabilidade por aquilo que faz. Não importa o que faz, primeiro ele tem de saber por que o faz e depois tem de prosseguir com seus atos sem ter dúvidas ou remorsos em relação a eles.

(Viagem à Ixtlan - Carlos Castaneda)

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Quadros - Escher

Livros - A jóia suprema do discernimento - Shankara


A Jóia Suprema do Dicernimento

Ó Senhor, que habitais em nosso íntimo
Vós sois a luz
No lótus do coração.
Om é o vosso eu,
Om, a mais sagrada das palavras,
Origem e fonte das escrituras.
Não pode a lógica descobrir-vos,
Ó Senhor, mas os iogues
Vos conhecem na meditação.
Em vós estão todas as faces de Deus,
Suas formas e aspectos;
Em vós também
Encontramos o guru.
Estais em todos os corações
E se, uma vez que seja,
Um homem abrir
Sua mente para receber-vos,
Em verdade esse homem
Será livre para sempre.

Jagadguru Adi Shankaracharya

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Pensamentos soltos - Sri Aurobindo

Espiritualidade é algo diferente de intelectualidade; seu aparecimento é o sinal de que um Poder maior do que a mente está lutando para emergir a seu tempo. A espiritualidade é um despertar progressivo para a realidade interna de nosso ser, para um espírito, em si, uma alma, que é diferente de nossa mente, vida e corpo. É uma aspiração interior a conhecer, a entrar em contato e união com a Realidade maior que está além, a qual também preenche o universo e habita em nós, e, como resultado dessa aspiração, desse contato e dessa união, uma virada, uma conversão, o nascimento rumo a um novo ser.

Sri Aurobindo 
(A evolução futura do homem)

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

A simbologia de Krishna




A roupa amarela: um dos nomes de Krishna é Peethambara Dhari (O que se veste de amarelo). Esta cor representa a terra e simboliza a Natureza (Prakriti). Assim, o Azul Krishna, vestido de amarelo simboliza o Infinito se revestindo de um corpo material e vindo à terra para representar um papel finito. O amarelo também está relacionado à Vishnu e ao Sol. Indica riqueza e nos lembra que o Senhor é o Sol da Consciência. 
A flauta: é o símbolo de que a divina música do Senhor está sempre nos chamando a ver nossa identidade com Ele. Também nos lembra a necessidade de nos livrarmos de nossos apegos materiais, transformando-nos em um instrumento oco, através do qual Divina Melodia possa fluir livremente
A coroa: indica que Ele é o Ser Supremo, o Senhor de tudo.A pena de pavão: enquanto está no chão, o pavão representa o ego, constantemente preocupado em exibir sua beleza. Porém, quando esquece sua vaidade e fecha sua cauda, o pavão levanta vôo em direção a Deus. 
A pena de pavão na cabeça de Krishna nos lembra que a verdadeira beleza está no Conhecimento de Deus, que nos faz voar até o Infinito e reconhecer nossa identidade com Ele. 
O Ponto Kasthuuri: Krishna usa um ponto de almíscar (Kasthuuri) na testa, representando a visão da Sabedoria, o olho que vê além das aparências e da dualidade. A jóia Kausthubha: a pedra preciosa que Ele usa em seu peito indica que Ananda (a Bem-aventurança) reside em Seu coração.
O Kankana: o bracelete que um hindu usa ao fazer um voto. Indica que Krishna tomou para Si o voto de estabelecer a Ordem e de estar sempre com aqueles que meditarem Nele, liberando os que realmente se entregarem.

OM Krishnaya Namah 


segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Poemas - Rumi - Masnavi



 Por mais que se descreva ou se explique o amor,
quando nos apaixonamos envergonhamo-nos de nossas palavras.
A explicação pela língua esclarece a maioria das coisas,
Mas o amor não explicado é mais claro.
Quando a pena se apressou em escrever,
Ao chegar no tema do amor, partiu-se em duas.
Quando o discurso tocou na questão do amor,
A pena partiu-se e o papel rasgou-se.
Ao explicá-lo, a razão logo empaca, como um asno no atoleiro;
Nada senão o próprio Amor pode explicar o amor e os amantes...

Djalal Ud-Din RUMI
Trecho do Masnavi

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Poemas - Encontro de Almas - Rumi



Encontro de almas

Vem.
Conversemos através da alma.
Revelemos o que é secreto aos olhos e ouvidos.

Sem exibir os dentes,
sorri comigo, como um botão de rosa.
Entendamo-nos pelos pensamentos,
sem língua nem lábios.

Sem abrir a boca,
contemo-nos todos os segredos do mundo,
como faria o intelecto divino.

Fujamos dos incrédulos
que só são capazes de entender
se escutam palavras e vêem rostos.

Ninguém fala para si mesmo em voz alta.
Já que todos somos Um,
falemos desse outro modo.

Como podes dizer à tua mão: "toca",
se todas as mãos são uma?
Vem, conversemos assim.

Os pés e as mãos conhecem o desejo da alma.
Fechemos pois a boca e conversemos através da alma.
Só a alma conhece o destino de tudo, passo a passo.

Vem, se te interessas, posso mostrar-te.

(Jalal ud-Din RUMI. Tradução: José Jorge de Carvalho - Poemas místicos: Divan de Shams de Tabriz. Editora Attar)

Poemas - Kabir



ESTA secreta palavra, 
poderei pronunciá-la alguma vez?
Como poderei dizer Ele não é desta meneira
ou assemelhá-lo seja ao que for?
Se digo que ele está dentro de mim,
o universo inteiro se envergonhará.
Se digo que Ele está fora de mim é falsidade.
Ele faz com que o mundo interior e o exterior sejam
indivisível Unidade.
O consciente e o inconsciente: sobre ambos
Ele repousa os pés.
Ele não é manifesto nem oculto: não é revelado,
tampouco deixaria de revelar-Se.
Não existem palavras para dizer o que Ele é.

Kabir

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Poemas - Somos uma só alma - Rumi




Em verdade, 
somos uma só alma, 
eu e tu.

Aparecemos e nos ocultamos,
Tu em mim, 

eu em ti.

Aqui está o sentido profundo da minha relação contigo:
Já não existe entre mim e ti,
Nem mim, nem tu.


Somos o espelho e o rosto ao mesmo tempo.


Estamos ébrios do cálice eterno.


Somos o bálsamo e a cura,
Somos a água da juventude e aquele que a verte.


Quando o teu olho 

se tornou num olho 
para o meu coração,

Meu coração cego se inundou nessa visão.


Vi que eras o espelho universal 

para toda a eternidade:
E eu disse: 


"No final, eu encontrei a mim mesmo:
Em seus olhos conheci o caminho da luz".

 Djalal Ud-Din RUMI

domingo, 24 de outubro de 2010

Pensamentos soltos - Goswami Tulsidas



“Você precisa de luz tanto dentro quanto fora de casa? 
Coloque então a lâmpada no degrau de sua entrada! 
Do mesmo modo, você deseja espalhar a iluminação da Paz (shanti) 
tanto fora quanto dentro de você? 
Coloque então o Nome do Senhor em sua língua, 
que é a porta de entrada de sua personalidade!
A lâmpada na língua não irá tremer, 
esmaecer ou se apagar por nenhuma tempestade. 
Ela lhe conferirá Paz,
bem como a todos que com você se encontrar, 
até o mundo inteiro”

Pensamentos soltos - Mo Tzu (Mozi)



O amor das pessoas umas pelas outras beneficiam-nas mutuamente. 
Aqueles que amam os outros também serão amados. 
Tratem outros países como seus, 
tratem outras famílias como a sua, 
e tratem outras pessoas como tratam a si mesmos.

(Mo-Tzu, Pensador Chinês, 480?-390? a.C)

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Pensamentos soltos - S. João da Cruz



Para vir a apreciá-lO por inteiro,
não queira apreciar mais nada;
Para vir a possuí-lO por inteiro,
não queira possuir mais nada;
Para vir a sê-lO por inteiro,
não queira ser mais nada;
Para vir a sabê-lO por inteiro,
não queira saber mais nada.

São João da Cruz
(Subida ao Monte Carmelo)

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Sri Ramakrisha e Jesus



Era de madrugada. Shri Ramakrishna estava acordado e meditava na Mãe Divina. Devido à enfermidade os devotos se viam privados do canto do nome da Mãe Divina.
Shri Ramakrishna estava sentada no pequeno divã. Perguntou a M., “Bem, por que tenho esta doença?”
M.: “As pessoas não se atreverão a se aproximar do senhor a não ser que se assemelhe a elas em todos os aspectos, mas ficam deslumbradas em descobrir que, apesar de sua doença, o senhor só pensa em Deus.”
Mestre (sorrindo): “Balaram também disse, ‘Se até o senhor pode ficar doente, por que temos de nos surpreender com nossas enfermidades?’ Lakshmana ficou admirado ao ver que Rama não podia levantar o arco por causa de Seu pesar por Sita. ‘Até Brahma chora, apanhado na armadilha dos cinco elementos.’ ”
M.: “Jesus cristo também chorou como um homem comum, com o sofrimento de seus devotos.”
Mestre: “Como foi isso?”
M.: “Havia duas irmãs, Maria e Marta que tinham um irmão, Lázaro. Os três eram devotos de Jesus. Lázaro morreu. Jesus estava a caminho de sua casa, quando uma das irmãs, Maria, correu para recebê-lo. Caiu a seus pés e disse chorando, ‘Senhor, se estivesse estado aqui, meu irmão não teria morrido!’ Jesus chorou ao vê-la chorar.
“Jesus foi à sepultura de Lázaro e o chamou pelo nome. Imediatamente Lázaro voltou à vida e saiu andando da tumba.
Mestre: “Mas não posso fazer estas coisas.”
M.: “È porque o senhor não quer. Esses são milagres, por isso, o senhor não está interessado neles. Essas coisas atraem a atenção das pessoas para seus corpos. Elas então, não pensam em devoção verdadeira. É por isso que o senhor não faz milagres, mas há muitas semelhanças entre o senhor e Jesus Cristo.”
Mestre (sorrindo): “O que mais?”
M.: “O senhor não pede a seus devotos que jejuem ou façam outras práticas. Não prescreve regras duras e estritas a cerca de alimento. Os discípulos de Cristo não observaram o sabbath e por esta razão, os fariseus os censurava. Por conseguinte Jesus disse, ‘Fizeram bem em comer. Enquanto estiverem com o noivo, devem divertir-se.’ ”
Mestre: “O que isto quer dizer?”
M.: “Cristo quis dizer que enquanto os discípulos vivessem com a Encarnação de Deus, deviam celebrar. Por que estarem tristes? Mas quando Ele retornar à sua própria morada no céu, então dias viriam de tristezas e sofrimentos.”
Mestre (sorrindo): “Você encontra em mim algo que seja semelhante a Cristo?”
M.: “Sim, senhor. O senhor diz, ‘Os jovens ainda não foram contaminados por “mulher e ouro” e por isso; serão capazes de receber instrução. É como guardar leite num pote novo; o leite pode azedar se for guardado num pote onde tenha sido feita a coalhada.’ Cristo também falou assim.”
Mestre: “O que ele disse?”
M.: “ ‘Se o vinho novo for mantido numa garrafa velha, ela pode rachar. Se um tecido velho for remendado a um novo, o velho se rasgará.’
“Além disso diz que o senhor e a Mãe são Uno. A mesma coisa disse Cristo, ‘Eu e Meu pai somos um’.”
Mestre (sorrindo): “Há mais?”
M.: “O senhor nos diz, ‘Deus certamente escutará se alguém O chamar com sinceridade. Assim, também, Cristo disse, ‘Bata na porta e ela lhe será aberta.’ ”
Mestre: “Bem, se Deus encarnou-Se de novo, será esta uma manifestação fracionária, parcial ou completa? Alguns dizem que se trata de uma manifestação completa.”
M.: “Senhor, não compreendo muito bem o significado completo ou parcial de uma Encarnação mas entendi como o senhor explicou, a idéia de um buraco redondo no muro.”
Mestre: “Fale-nos sobre isto.”
M,: “Há um buraco redondo no muro. Através dele pode-se ver parte do campo que se estende  do outro lado. Assim também, através do senhor pode-se ver parte do Deus Infinito.”
Mestre: “É verdade. Pode-se ver cinco ou seis milhas do campo de uma só vez.”M. terminou o banho no Ganges e foi para o quarto do Mestre. Eram oito horas da manhã. Pediu a Latu que desse ao Mestre o prasad de arroz de Jagannath. O Mestre ficou perto dele e disse, “Tome este prasad regularmente. Aqueles que são devotos de Deus não comem nada antes de comer o prasad.”
M.: “Ontem tomei um pouco de prasad de Jagannath na casa de Balaram Babu. Como um ou dois grãos diariamente.”
M. saudou o Mestre e despediu-se. Shri Ramakrishna disse-lhe afetuosamente, “Venha amanhã bem cedo. O sol quente da estação chuvosa faz mal à saúde.” 


(Evangelho de Ramakrishna)

Segunda-feira, 31 de agosto de 1885


domingo, 26 de setembro de 2010

Sabedoria Egípcia - O ser de luz


O ser de luz está destinado ao céu. (Textos das pirâmides)

Dá a plenitude ao espírito de luz, faz o que ele ama. (Ani)

Eu explorei o céu,
escavei o país de luz,
Percorri a luz,
segui seu percurso caminhando,
tornei-me senhor de forças espirituais de meu predecessor, 
Pois sou realmente um ser dotado de luz. 
(Texto dos sarcófagos, capítulo 574)

O homem deve realizar o que é útil e luminoso para o seu ba (alma-pássaro) - Merikarê



sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Apascentando o Touro - Kakuan


A caminhada espiritual do discípulo é narrada pelo Zen através de dez ilustrações criadas por Kakuan no séc XII. Estas narram uma alegoria intitulada Apascentando o touro. Os dez quadros representam os degraus progressivos de percepção que  levam cada vez mais perto do instante absoluto da iluminação. Mestre Kakuan escreveu os comentários em prosa e verso que vemos aqui.
 
 
EM BUSCA DO TOURO

Na pastagem deste mundo, empurro infindavelmente para 
o lado o capim alto, em busca do touro. 
Seguindo os rios sem nome, perdido nos caminhos 
interprenetrantes de montes remotos. 
Minha resistência esmorecendo e minha vitalidade 
esgotada, não consigo encontrar o touro. 
Ouço apenas os gafanhotos cricrilando pela floresta à noite.

Comentário: O touro jamais se perdeu. Que necessidade há de sair à procura? Só por causa da separação da minha verdadeira natureza eu não consigo encontrá-lo. Na confusão dos sentidos, perco até suas pegadas. Longe de casa, vejo muitas encruzilhadas, mas qual é o caminho certo eu não sei. Cobiça e medo, o bom e o mau, enredam-me.


DESCOBRINDO AS PEGADAS
 
Acompanhando a margem encontro pegadas embaixo das árvores!
Até embaixo do capim cheiroso vejo as pegadas dele.
Nas vastidões de montes distantes elas são encontradas.
Esses traços não podem ser mais escondidos que o nariz de alguém que olha para o céu.

Comentário: Compreendendo o ensinamento, enxergo as pegadas do touro. Compreendo então que, assim como muitos utensílios são feitos de um metal, miríades de entidades também são feitas do tecido do Eu. A não ser que eu discrimine, como vou perceber o que é verdadeiro ou não é? Apesar de ainda não ter atravessado a porta, distingui o caminho.


PERCEBENDO  O  TOURO
 
Ouço o canto de um rouxinol.
O sol está quente, o vento é suave, os salgueiros verdes
acompanham a margem;
aqui nenhum touro pode se esconder!
Que artista consegue desenhar aquela cabeça imponente, 
aqueles chifres majestosos?

Comentário: Quando ouvimos uma voz, podemos perceber de onde vem. Logo que os seis sentidos se fundem, atravessamos a porta. Entretanto, vemos imediatamente a cabeça de um touro! Essa identidade é como o sal na água, como a cor no corante. Nem a mais ínfima coisa está separada do Eu.
 

CAPTURANDO O TOURO
 
Agarro-o com um esforço terrível.
Suas enormes vontade e força são inesgotáveis.
Ele arremete para o planalto elevado, muito acima das nuvens
Ou fica parado numa ravina impenetrável.

Comentário: Ele se demorou na floresta durante muito tempo, mas hoje eu o apanhei! A fascinação pelo cenário interfere em seu rumo. Ansiando por um capim mais doce, ele se afasta, errante. Ainda tem a mente obstinada e desenfreada. Querendo subjugá-lo, terei de levantar meu relho.
 

DOMANDO O TOURO
 
O relho e a corda são necessários,
Senão ele poderia se desgarrar para alguma estrada poeirenta.
bem treinado, torna-se manso naturalmente.
Depois, libertado, obedece ao mestre.

Comentário: Quando um pensamento surge, logo vem outro. Quando o primeiro pensamento nasce da iluminação, todos os pensamentos subsequentes são verdadeiros. Pela ilusão, fazemos tudo ser inverídico. A ilusão não é provocada pela objetividade, é o resultado da subjetividade. Mantenha firme a argola de nariz do touro e não permita a mínima dúvida.
 

MONTADO O TOURO DE VOLTA PARA CASA
 

Montando o touro, volto para casa devagar:
A voz de minha flauta entoa pela noitinha.
Acompanhando a harmonia pulsante com batidas de mão,
dirijo o ritmo eterno.
Qualquer pessoa que ouve esta melodia se junta a mim.


Comentário: esta luta acabou; ganho e perda estão assimilados. Canto a canção do lenhador da aldeia e toco as melodias das crianças. Escarranchado no touro, observo as nuvens lá no alto. Adiante eu vou, não importa quem possa querer me chamar de volta.
 

O TOURO TRANSCENDIDO
 
Escarranchando no touro, chego em casa.
Estou sereno. O touro também pode descansar.
A aurora chegou. Em repouso jubiloso,
Dentro de minha morada coberta de sapé abandonei o relho e a corda.

Comentário: Tudo é uma lei, não duas. Fazemos do touro apenas um objeto temporário. É como a relação entre o coelho e a armadilha, entre o peixe e a rede. É como o ouro e a escória, ou como a lua surgindo de uma nuvem. Uma trilha de luz clara segue adiante pelo tempo infinito.
 

O TOURO E O EU TRANSCENDIDOS
 
Relho, corda, pessoa e touro - tudo se funde em Coisa Nenhuma.
Este céu é tão vasto que nenhuma mensagem consegue manchá-lo.
Como pode um floco de neve existir num incêndio devastador?
Aqui estão as pegadas dos patriarcas.

Comentário: A mediocridade se foi. A mente está livre das limitações. Não estou em busca de nenhum estado de iluminação. Nem permaneço onde não há nenhuma iluminação. Como não me demoro em nenhum desses estados, nenhum olho consegue me ver. Se centenas de pássaros forrassem meu caminho de flores, seria um louvor sem significado.
 

CHEGANDO À ORIGEM
 
Foram dados passos demais para voltar à raiz e à origem.
Melhor seria ter sido cego e mudo desde o início!
habitar nossa morada verdadeira, sem preocupação com o que há lá fora:
O rio flui tranquilo e as flores são vermelhas.

Comentário: Desde o início a verdade é clara. Em atitude silenciosa, observo as formas de integração e de desintegração. Quem não está ligado à forma não precisa ser reformado. A água é verde esmeralda, a montanha é azul anil e eu vejo o que está criando e o que está destruindo.


 

NO MUNDO
 
Descalço e de peito nu, misturo-me com as pessoas do mundo.
minhas roupas estão esfarrapadas e cobertas de pó e estou mais jubiloso do que nunca.
Não uso magia para estender minha vida;
Agora as árvores mortas revivem diante de mim.

Comentário: Do lado de dentro de minha porta, mil sábios não me conhecem. A beleza do meu jardim é invisível. Por que se deveria sair em busca das pegadas dos patriarcas? Vou ao mercado com minha garrafa de vinho e volto para casa com meu cajado. Visito a loja de vinhos e o mercado e todos aqueles para quem dirijo o olhar alcançam a iluminação.

Fontes:  

Quadros: Obtido em: http://www.samamultimidia.com.br/port/catalogo/art03-zen.html.
Texto: O pequeno Buda. Samuel Bercholz e Sherab Chödzin Kohn.