sábado, 12 de fevereiro de 2011

Amritabindu Upanishad (Upanishad da Gota de Ambrosia)



Tem se falado que a mente humana
pode ter dois aspectos:
o puro e o impuro.
O impuro, se ela é escrava do desejo;
puro, quando ela está liberta do desejo.
Ora, é a mente (manas), só ela,
a causa imediata
tanto do cativeiro
como da liberdade dos humanos;
quando ela se apega aos bens deste mundo
é conduzida ao cativeiro,
mas, se ela se liberta desse apego,
é conduzida à liberdade.

Se, pois, para desejar a libertação,
é preciso ter a mente livre dos laços
do desejo dos bens deste mundo,
o homem quer a libertação
deverá primeiro cortar os laços
que mantém presa a sua mente.

Porque não é senão quando a mente,
livre de todo apego,
tiver conquistado a maestria interior,
destruindo assim o seu próprio ser,
que se atingirá o estado supremo!

Mas enquanto a instabilidade se instalar no coração
mais serão longos os esforços 
que precisará realizar para liberar a mente:
esses esforços são o que se chama
de Conhecimento e Meditação,
o resto não é senão bravatas e vãs dissertações!

Mas isto não significa
que esteja quase a recusar-se a pensar,
mais do que a se consagrar
ao único prazer de raciocinar!
De fato, é preciso refletir bem,
mas não permanecer na reflexão,
porque Brahman não será reconhecido
senão quando tiver a mente livre
de todos os sistemas preconcebidos.

É preciso, pois, combinar
a prática dedicada do Yoga
com  a enunciação da sílaba OM,
ainda que o silêncio produza na realidade
um benefício muito maior:
porque, quando não se mantém o silêncio completo,
não se busca o aniquilamento:
e é ao Ser que se visa!

É isso, isso somente,
Brahman sem divisão,
sem distinções, nem atributos.
E quando o yogin reconheceu
que ele mesmo é Brahman,
realizou para sempre Brahman.

Sim, ele estará livre por fim,
o yogin avisado que souber reconhecer
Brahman sem distinções, nem limites,
Brahman que não se pode nem provar,
nem explicar, nem demonstrar,
Brahman sem começo, nem fim!

Não! Não é nem o fim do mundo,
nem a sua primeira aparição;
nem o ser-nos-laços, nem o ser liberto;
nem o yogin buscando a sua libertação,
nem o yogin que a encontrou
assim, se diz, se define o Fim Supremo,
que está além de toda definição.

É preciso saber que a Alma é una,
mesmo se ela parece apresentar
formas e aspectos diversos
em vigília, nos sonhos e no sono profundo.
Porque, para quem sabe transcender a esses três estados, 
não há mais renascimento.

Sim, ela é una, a Alma
presente em cada indivíduo
embora ela pareça ao mesmo tempo
como múltipla e como única,
à maneira da Lua
refletida na água em movimento.

Quem transporta um jarro
transporta também o espaço que está nele.
Se quebra o jarro, ele está destruído,
não o espaço, que ele continha:
esse é propriamente indestrutível por si mesmo,
ainda que se tenha destruído o corpo que ela continha,
a alma individual assemelha-se a uma nuvem.

Sim, a alma é como o espaço
contido no jarro: são numerosos estes
e, portanto, quando um jarro é destruído
não se pensa que o espaço que ele continha foi destruído com ele
porque se sabe que o espaço é eterno.

Preso aos prestígios do verbo
não se vai ao fim supremo,
da mesma forma que não se encontra um lótus
ao procurá-lo nas trevas,
mas quando o consegue
vê-se logo a Unidade!

Portanto se diz que Brahman
é o Verbo, a palavra articulada.
Na realidade, quando a palavra é destruída
o que resta é o Verbo puro
a ressonância primordial
sabendo isso pode-se meditar sobre o Verbo,
se se desejar ter a paz da alma.

Eis duas doutrinas,
dignas uma e outra de serem conhecidas
porque Brahman é ao mesmo tempo o Verbo
e o Absoluto depois do Verbo.
É preciso de início conhecer o Verbo-Brahman
depois esquecer o Verbo e buscar o Absoluto.

O yogin então terá razão
de assimilar a fundo o conteúdo dos livros
com a condição de ultrapassar mais tarde esse estado
e de rejeitar todos os livros,
da mesma maneira como rejeita a casca
quem quer encontrar o grão!

Sabe-se bem que o leite
tem sempre a mesma cor,
quando as inúmeras vacas que o produzem
têm pelos de aspectos diversos:

Assim a ciência é única
da mesma forma que a cor do leite é imutável;
assim, as doutrinas são múltiplas,
como o são as cores das pelagens das vacas.

E o conhecimento está escondido
em cada indivíduo, da mesma forma que no leite
está a manteiga que não se pode ver
e é por isso que o yogin deve retirar de si
a manteiga interior, constante,
utilizando seu próprio espírito
como desnatadeira.

Pode-se dizer também da mesma forma
que tendo aguçado sua visão mental
o yogin extrairá de si mesmo o Supremo Brahman
como se extrai o fogo pela fricção de dois bastões.

Esse mistério indiviso
imóvel, dominado, eis o Fim supremo,
em direção ao qual o yogin se dirige
Ele o atingiu quando pode dizer:
"Esse Brahman SOU EU!"

Esse Brahman em direção ao qual se vai,
como em direção a um refúgio oferecido a todos os seres,
É Vasudeva (Vishnu), que reside em cada um
e marca todas as coisas com o selo do seu favorecimento!

Dizendo: "Eu sou Ele!"
Diz-se, na verdade, que se é o Deus Vasudeva;
Sim, diz-se com todo direito: "Eu sou Vasudeva!"
"Eu sou Vasudeva"

Tal é a Upanishad

FONTE:
TINOCO, Carlos A. As Upanishads do Yoga: Textos sagrados da Antigüidade. São Paulo: Madras Editora, 2006.

Um comentário:

Anônimo disse...

O que não pode ser aprendido pelas palavras as vezes pode ser pelo silêncio.
Valeu William.